quinta-feira, 31 de outubro de 2013

Morte e Vida de São Francisco de Assis

Por Frei Nilo Agostini, OFM
Todo debilidato, com voz fraca, sumida, entoa Francisco o Salmo 142: Você mea ad Dominum clamavi (“Com minha voz clamei ao Senhor…”). O Salmo vai sendo entoado pouco a pouco, e ao chegar ao versículo Educ de custodia animam meam (“Arranca do cárcere minha alma, pra que vá cantar teu nome, pois me esperam os justos e tu me darás o galardão”). Faz-se grande e profundo silêncio. Acabara de morrer, cantando, Francisco de Assis.
Quem é este que transfigura o trauma da morte em expressão de liberdade tão suprema? Desaparece o sinistro da morte. E Francisco vai ao seu encontro como quem vai abraçar e saudar uma irmã muito querida.
Ano de 1226. Francisco se acha muito debilitado. Seu estômago não aceita mais alimento algum. Chega a vomitar sangue. Admiram-se todos como um corpo tão enfraquecido, já tão morto, ainda não tenha desfalecido. Transportado de Sena para Assis, Francisco ainda encontra forças para exortar os que acorrem a ele. E aos irmãos diz: “Meus irmãos, comecemos a servir ao Senhor, porque até agora bem pouco fizemos”. Ao chegar a Assis, um médico se apresenta e constata que nada mais resta a fazer. Ao que Francisco exclama: “Bem-vinda sejas, irmã minha, a morte!” E convida aos irmãos Ângelo e Leão para cantarem o Cântico do Irmão Sol, ao qual Francisco Acrescenta a última estrofe em louvor a Deus pela morte corporal.
Cria-se uma atmosfera tão jovial e alegre que o Ministro Geral da Ordem, Frei Elias, interpela Francisco para que pare com toda aquela atmosfera, vista como “cantoria”, para que enfim ele morra “convenientemente”, pois poderia escandalizar os moradores de Assis. “Com tudo o que sofro, me sinto tão perto de Deus que não posso senão cantar!” – respondeu-lhe Francisco.
Aproximando-se a hora derradeira, Francisco deseja ser levado para a capelinha de Nossa Senhora dos Anjos, na Porciúncula, onde tudo havia começado. Lá, num gesto de despojamento, de identificação com o Cristo crucificado e de integração com o Pai, pede que o deixem, nu, sobre a terra e diz aos frades: “Fiz o que tinha que fazer. Que Cristo vos ensine o que cabe a vós”. Despede-se de todos os irmãos; abençoa-os; lembra-lhes que “o Santo Evangelho é mais importante que todas as demais instituições”. Ainda deseja que Irmã Jacoba lhe traga alguns daqueles deliciosos biscoitos. Anima o seu médico, dizendo-lhe: Irmão médico, dize com coragem que a minha morte está próxima. Para mim, ela é a porta para a vida!” E, então, canta o Salmo 142. Francisco parte cantando, cortês, hospitaleiro e reconciliado com a morte.
O canto de Francisco está baseado em uma percepção realista da morte: “Nenhum homem pode escapar da morte”. Mas como pode ser irmã aquela que engole a vida, que decepa aquela pulsão arraigada em cada um de nós, fundada em um “desejo” que busca triunfar sobre a morte e viver eternamente? Francisco acolhe fraternalmente a morte. Nele realiza-se, de forma maravilhosa, o encontro entre a vida e a morte, em um processo de integração da morte.
Francisco acolhe a vida assim como ela é, ou seja, em sua exigência de eternidade e em sua mortalidade. Tanto a vida como a morte são um processo que perdura ao longo de toda a vida. A morte faz parte da vida. Como e despertar e o adormecer, assim é a morte para o ser humano. Ela não rouba a vida; dá a esse tipo de vida a possibilidade de outro tipo de vida, eterna e imortal, em Deus.
A morte não é então negação total da vida, não é nossa inimiga, mas é passagem para o modo de vida em Deus, novo e definitivo, imortal e pleno. Francisco capta esta realidade e abriga a morte dentro da vida. Acolhe toda limitação e mostra-se tolerante com a pequenez humana, a sua e a dos outros.
A grandeza espiritual e religiosa de Francisco no saudar e cantar a morte significa que já está para além da própria morte; ela, digna hóspede não lhe é problema; ao contrário, ela é a condição de viver eternamente, de triunfar de modo absoluto, de vencer todo embotamento do pecado que a transforma em tragédia. Francisco soube mergulhar na fonte de toda a vida. “Enquanto Deus é Deus, enquanto Ele é o vivente e a Fonte de toda a vida, eu não morrerei, ainda que corporalmente morra!” (L. Boff).
Morte, drama sagrado,
não uma tragédia.
Morte, bem-vinda,
não uma inimiga.
Morte, uma irmã,
não uma ladra.
Morte, abertura para a plena liberdade,
presença do Reino de Deus, utopia do justos.
“Deus enxugará as lágrimas dos seus olhos, e a morte não existirá mais,
nem haverá mais luto, nem pranto, nem fadiga, porque tudo isso já passou” (Ap 21,4).
“Louvado sejas, meu Senhor, pela nossa irmã,
a morte corporal, da qual nenhum vivente pode escapar” (São Francisco, Cântico do Irmão Sol).
Sermão proferido por Frei Nilo Agostini, na Festa de São Francisco de Assis, 04/10/1991
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Por Frei Nilo Agostini, OFM
Todo debilitado, com voz fraca, sumida, entoa Francisco o Salmo
142: Você mea ad Dominum clamavi (“Com minha voz clamei ao Senhor…”). O Salmo vai sendo entoado pouco a pouco, e ao chegar ao versículo Educ de custodia animam meam (“Arranca do cárcere minha alma, pra que vá cantar teu nome, pois me esperam os justos e tu me darás o galardão”). Faz-se grande e profundo silêncio. Acabara de morrer, cantando, Francisco de Assis.
Quem é este que transfigura o trauma da morte em expressão de liberdade tão suprema? Desaparece o sinistro da morte. E Francisco vai ao seu encontro como quem vai abraçar e saudar uma irmã muito querida.
Ano de 1226. Francisco se acha muito debilitado. Seu estômago não aceita mais alimento algum. Chega a vomitar sangue. Admiram-se todos como um corpo tão enfraquecido, já tão morto, ainda não tenha desfalecido. Transportado de Sena para Assis, Francisco ainda encontra forças para exortar os que acorrem a ele. E aos irmãos diz: “Meus irmãos, comecemos a servir ao Senhor, porque até agora bem pouco fizemos”. Ao chegar a Assis, um médico se apresenta e constata que nada mais resta a fazer. Ao que Francisco exclama: “Bem-vinda sejas, irmã minha, a morte!” E convida aos irmãos Ângelo e Leão para cantarem o Cântico do Irmão Sol, ao qual Francisco Acrescenta a última estrofe em louvor a Deus pela morte corporal.
Cria-se uma atmosfera tão jovial e alegre que o Ministro Geral da Ordem, Frei Elias, interpela Francisco para que pare com toda aquela atmosfera, vista como “cantoria”, para que enfim ele morra “convenientemente”, pois poderia escandalizar os moradores de Assis. “Com tudo o que sofro, me sinto tão perto de Deus que não posso senão cantar!” – respondeu-lhe Francisco.
Aproximando-se a hora derradeira, Francisco deseja ser levado para a capelinha de Nossa Senhora dos Anjos, na Porciúncula, onde tudo havia começado. Lá, num gesto de despojamento, de identificação com o Cristo crucificado e de integração com o Pai, pede que o deixem, nu, sobre a terra e diz aos frades: “Fiz o que tinha que fazer. Que Cristo vos ensine o que cabe a vós”. Despede-se de todos os irmãos; abençoa-os; lembra-lhes que “o Santo Evangelho é mais importante que todas as demais instituições”. Ainda deseja que Irmã Jacoba lhe traga alguns daqueles deliciosos biscoitos. Anima o seu médico, dizendo-lhe: Irmão médico, dize com coragem que a minha morte está próxima. Para mim, ela é a porta para a vida!” E, então, canta o Salmo 142. Francisco parte cantando, cortês, hospitaleiro e reconciliado com a morte.
O canto de Francisco está baseado em uma percepção realista da morte: “Nenhum homem pode escapar da morte”. Mas como pode ser irmã aquela que engole a vida, que decepa aquela pulsão arraigada em cada um de nós, fundada em um “desejo” que busca triunfar sobre a morte e viver eternamente? Francisco acolhe fraternalmente a morte. Nele realiza-se, de forma maravilhosa, o encontro entre a vida e a morte, em um processo de integração da morte.
Francisco acolhe a vida assim como ela é, ou seja, em sua exigência de eternidade e em sua mortalidade. Tanto a vida como a morte são um processo que perdura ao longo de toda a vida. A morte faz parte da vida. Como e despertar e o adormecer, assim é a morte para o ser humano. Ela não rouba a vida; dá a esse tipo de vida a possibilidade de outro tipo de vida, eterna e imortal, em Deus.
A morte não é então negação total da vida, não é nossa inimiga, mas é passagem para o modo de vida em Deus, novo e definitivo, imortal e pleno. Francisco capta esta realidade e abriga a morte dentro da vida. Acolhe toda limitação e mostra-se tolerante com a pequenez humana, a sua e a dos outros.
A grandeza espiritual e religiosa de Francisco no saudar e cantar a morte significa que já está para além da própria morte; ela, digna hóspede não lhe é problema; ao contrário, ela é a condição de viver eternamente, de triunfar de modo absoluto, de vencer todo embotamento do pecado que a transforma em tragédia. Francisco soube mergulhar na fonte de toda a vida. “Enquanto Deus é Deus, enquanto Ele é o vivente e a Fonte de toda a vida, eu não morrerei, ainda que corporalmente morra!” (L. Boff).
Morte, drama sagrado,
não uma tragédia.
Morte, bem-vinda,
não uma inimiga.
Morte, uma irmã,
não uma ladra.
Morte, abertura para a plena liberdade,
presença do Reino de Deus, utopia do justos.
“Deus enxugará as lágrimas dos seus olhos, e a morte não existirá mais,
nem haverá mais luto, nem pranto, nem fadiga, porque tudo isso já passou” (Ap 21,4).
“Louvado sejas, meu Senhor, pela nossa irmã,
a morte corporal, da qual nenhum vivente pode escapar” (São Francisco, Cântico do Irmão Sol).
Sermão proferido por Frei Nilo Agostini, na Festa de São Francisco de Assis, 04/10/1991
Fonte http://www.franciscanos.org.br/?p=24967#sthash.eDqkxDQD.dpuf

sexta-feira, 25 de outubro de 2013

A MÍSTICA DE SÃO FRANCISCO DE ASSIS


1.1 – Características da Mística na fluência do século XX

No século XX cresce o debate sobre a natureza da mística e a universalidade desta experiência. Até o Concílio Vaticano II, os caminhos da mística começavam na hermenêutica baseada sobre as Fontes Bíblicas e da Patrística; porém é exatamente a partir daí que começa a elucidar o significado de natureza do estado místico, da vocação universal à perfeição, do itinerário de virtudes, do vértice da experiência espiritual, dos fenômenos místicos e retoma-se a questão da contemplação adquirida (ativa) e da contemplação infusa (passiva), duas compreensões que têm a ver com o direcionamento da VIA PERFECTIONIS através, da UNIO MÍSTICA, uma espécie de matrimônio espiritual. A mística é essencial para a perfeição e caminho obrigatório para chegar ao ESTADO MÍSTICO, isto é, o próprio Amor recebido diretamente de Deus.

Não se pode deixar de lembrar que nos dois casos existem os fenômenos extraordinários que os acompanham: a prece mística, os efeitos que aparecem além do esforço humano, a pura graça; ou aqueles que tem a cooperação dos exercícios necessários tais como: meditação orientada, silêncio, prece comum. A contemplação adquirida é ativa e ordinária. A contemplação infusa é passiva e extraordinária.

Independente da questão de um Curso Sistemático de Teologia Espiritual, que a partir de 1931, com Pio XI, coloca a ascética como disciplina auxiliar e a mística como disciplina especial. O que nos interessa aqui nesta reflexão? Mostrar que todo este desenvolvimento une num mesmo tronco a mística e a ascética na História da Espiritualidade. Que a perfeição cristã vai crescendo graças à presença de dons do Espírito Santo que operam sobrenaturalmente na vida mística, e a busca incessante da vida da graça, da fé, da caridade e de dons do Espírito Santo, da força extraordinária dos milagres, das visões e da profecia.

Tudo isto faz parte do desenvolvimento da via espiritual e encontra a sua culminância na contemplação e na experiência mística.

Não podemos esquecer de citar o grande pensador cristão Jacques Maritain (1882-1973), que mostra em sua obra o fascínio pela mística; para ele a mística é a culminância de toda forma de conhecimento e consequência da verdadeira metafísica. Para ele, mística é conhecimento das coisas profundas de Deus, experiência esta que vai do contato direto e imediato com Ele, um contato que envolve amor e conhecimento.
fonte:http://carismafranciscano.blogspot.com.br/

quarta-feira, 23 de outubro de 2013

O que é o "Carisma Franciscano"?

Por Frei Carlos Guimarães, OFMConv.

Quando se fala de Carisma, antes de qualquer outra coisa, deve-se necessariamente reportar a São Paulo (1Cor 12-13), a partir do qual se pode estabelecer que os carismas são dons do Espírito Santo conferidos aos eleitos, ou seja, aos batizados, para que a Igreja, ao longo dos tempos, possa eficazmente realizar a sua finalidade principal: levar os homens à salvação e ser uma presença clara e atuante de Jesus Cristo no mundo.


E o valor destes dons é sempre o bem comunitário posto a serviço de todo o Corpo Místico, de forma que cada um de seus membros recebe, além da justificação batismal, uma graça destinada a torná-lo co-responsável por sua atividade pessoal, pela salvação de todo o corpo: “carismas diferentes, de acordo com a graça que Deus concedeu a cada um... e conforme o impulso da fé” (Rm 12, 6).

Assim sendo, cada batizado possui a capacidade para ser transformado em instrumento do e pelo Espírito Santo, para cumprir uma tarefa específica na manifestação do Reino de Deus e edificação/ atualização da vida de sua Igreja, em tempos determinados, atendendo a necessidades determinadas do povo de Deus.
Conformando-se às disposições humanas de cada batizado, o Espírito Santo orienta a vocação geral de todo cristão para a santidade e para o apostolado, para este ou aquele serviço; e isto se dá no momento propício – geralmente marcado por uma mudança radical e dolorosa de vida: a conversão – em que o cristão se abre plenamente à graça do mesmo Espírito que o conduz a uma missão importante e única a favor de toda Igreja.
Em certos momentos da história da humanidade, o Espírito suscita pessoas específicas para, por meio de uma profunda experiência com Deus, trazer vida nova para a sua Igreja e para o mundo, relembrando-os de algo esquecido ou chamando sua atenção para um aspecto novo ou negligenciado de sua caminhada.
A partir deste ponto, o convertido realiza uma singular experiência evangélica que o faz abandonar tudo que antes lhe era agradável, para se conformar com os apelos que o Espírito faz em seu interior. E isto ocorre com tal intensidade que seu novo modo de viver e agir e seu exemplo vibram como uma nova proclamação do Evangelho, uma nova visão da Palavra de Deus, que transcende os limites pessoais e afetam as pessoas a sua volta, convocando-as a fazer a mesma experiência.
O convertido consegue fazer com que o grupo participe de seu carisma pessoal que, desde este momento, passou a ser meta e orientação para o próprio grupo. O convertido transforma-se em referencial para toda uma geração de seguidores, converte-se em fundador de toda uma maneira própria de ver o homem e o mundo.
É nesta dinâmica que se dá e que se deve procurar apreender a experiência pessoal de São Francisco de Assis, que culmina na gênese e na construção do Carisma Franciscano

domingo, 13 de outubro de 2013

MEDITAÇÃO CRISTÃ


# Meditar é recolher-se na quietude interior para ficar em total silêncio na presença de Deus.

# Meditar é retirar-se às profundezas de si mesmo para deixar-se marcar pelo Mistério Divino.

# Meditar é abandonar-se com confiança nos braços do Pai em profunda quietude de corpo, mente e coração.

# A meditação é antes de tudo um “encontro” conosco mesmo e com Deus que nos aguarda nas profundezas de nosso ser.

COMO MEDITAR

1- Num lugar tranqüilo, sente-se confortavelmente, mantendo a coluna reta.
2- Feche seus olhos e permaneça em quietude profunda.
3- Em silêncio, interiormente,comece a repetir o Nome mais belo e mais santo que há: JESUS.
4- Permaneça repetindo o Nome Santo de Jesus, voltando para ele toda a sua atenção.
5- Toda vez que sua atenção se desviar do Santo Nome (distrações), volte a ele com paciência e tranqüilidade.
6- Não fique refletindo sobre o sentido do Nome de Jesus. Sua única tarefa consiste em repeti-lo interiormente com toda atenção possível.
7- Medite por um período de 20 a 30 minutos, sempre no início e no final de cada dia.

Durante a meditação, permaneça imóvel e relaxado. Porém, consciente e vigilante. Tenha cuidado para não dormir.
Em profundo silêncio, abandone-se nos braços do Pai, que acolhe você incondicionalmente, e escute o Espírito Santo clamar dentro de você o Nome que está acima de todo nome: JESUS.
Persevere, e você experimentará o sabor da Vida Nova.
Em meio aos seus afazeres cotidianos ou em seu descanso, permaneça a se lembrar do Santo Nome de Jesus. Nunca se esqueça daquele que nunca se esquece de você.
O LUGAR DA MEDITAÇÃO
Em sua casa, você deverá escolher um lugar tranqüilo, aconchegante e agradável para ser o seu “cantinho de meditação”. Esse cantinho será o lugar consagrado para o seu encontro com Deus no silêncio contemplativo, sempre no início e no final de cada dia.
Para que você se mantenha numa postura correta e confortável durante toda a meditação, é importante a escolha de uma cadeira adequada à sua altura.
OS FUNDAMENTOS DA MEDITAÇÃO CRISTÃ

O método da meditação cristã encontra seus primeiros fundamentos na vida e nos ensinamentos dos Padres do Deserto. Tais ensinamentos chegaram até nós graças ao esforço de antigos monges, bispos e teólogos que nos transmitiram em suas obras toda a riqueza da oração contemplativa vinda do deserto.


1. SÃO JOÃO CASSIANO:

Nasceu por volta do ano 360 na Cítia Menor, onde hoje encontramos a Romênia. Ainda bem jovem, partiu para a Palestina, tornando-se monge em Belém. Peregrinou pelo deserto do Egito, onde foi instruído nos costumes monásticos por grandes mestres espirituais. Mais tarde, após passar um tempo em Constantinopla, chegou a Roma, e de lá foi se instalar em Marselha (França), onde fundou dois mosteiros: um masculino e outro feminino. Escreveu obras importantes, nas quais foram registrados os melhores ensinamentos que recebera dos seus mestres espirituais. Suas duas obras principais são as Instituições cenobíticas e as Conferências dos Padres. Morreu no ano de 435.
 Para colocar em prática o mandato do apóstolo “orai sem cessar” (1Ts 5,17), João Cassiano, transmitindo os ensinamentos dos antigos Padres do Deserto, aconselha na sua X Conferência o uso da repetição incessante de um versículo:
“Para possuir a lembrança contínua de Deus, ser-vos-á proposta como inseparável esta fórmula de piedade: Ó Deus vinde em meu auxílio; Senhor, apressai-vos a socorrer-me (Sl 69,2).
(...) Resumindo, direi que este versículo é útil e necessário para todos nós, qualquer que seja a situação e cada um.
(...) Portanto, este versículo deve ser rezado incessantemente e continuamente: na adversidade, para dela sermos libertados; na prosperidade, para nela nos conservarmos e não cairmos no orgulho. Sim, que a meditação deste versículo se revolva ininterruptamente no teu coração. Ocupado em qualquer trabalho ou ofício ou em viagem, não cesses de o repetir. (...) Este revolver do coração tornar-se-á para ti uma fórmula de salvação que não só te guardará ileso de qualquer investida dos demônios, mas também, purificando-te de todos os vícios e do contágio terreno, te conduzirá à contemplação das coisas celestes e invisíveis e àquele ardor inefável de oração experimentado por poucos. Que o sono te surpreenda a meditar este versículo, até que, modelado pela sua meditação incessante, te habitues a repeti-lo mesmo durante o sono. Que ele seja o primeiro pensamento a ocorrer-te ao acordares e, uma vez desperto, tenha a primazia sobre todos os outros.
(...) Sim, que a alma retenha incessantemente esta fórmula, até que, fortalecida pela sua repetição constante e meditação contínua, venha a rejeitar e a recusar as riquezas e os abundantes bens de toda a espécie de pensamentos e, assim exercitada pela pobreza deste versículo, chegue, por um declive fácil, àquela bem-aventurança evangélica que detém a primazia entre todas as outras: bem-aventurados os pobres em espírito, porque deles é o Reino dos céus (Mt 5,3)”.(São João Cassiano, X Conferência, cap.X e XI).
2. A NUVEM DO NÃO-SABE
Em fins do século XIV, na Inglaterra, um autor anônimo, provavelmente um monge, escreveu uma obra chamada “A Nuvem do não-saber”, dedicada especialmente a todos aqueles que desejam trilhar os caminhos da oração contemplativa. Nesta obra, o autor oferece uma maneira de lidar com os diversos pensamentos (distrações), que se fazem presentes na mente do orante, quando este deseja apenas estar na presença de Deus, em completo silêncio contemplativo:
“Levante então seu coração para Deus com um humilde impulso de amor e destine-o ao Deus que criou você e o resgatou, e que na sua graça chamou você para este exercício. (...) Escolha uma palavra que seja curta e que tenha apenas uma sílaba: uma palavra que tenha apenas uma sílaba é melhor do que a que tem duas, pois quanto mais curta a palavra, melhor concorda com o trabalho do espírito. Assim é a palavra ‘Deus’ ou a palavra ‘amor’. Escolha a que você preferir, ou qualquer outra segundo o seu gosto. Selecione, pois, a palavra de uma sílaba de sua preferência. Prenda esta palavra ao seu coração, de modo que, aconteça o que acontecer, ela jamais vá embora. Esta palavra há de ser o seu escudo e a sua espada, quer você esteja cavalgando na paz ou na guerra. (...) Com esta palavra você deverá abater toda espécie de pensamento.” (A Nuvem do não-saber, cap. VII).
3. JOHN MAIN
John Main nasceu em Londres no ano de 1926, no seio de uma família católica irlandesa. Após ter estudado Direito em Dublin, foi trabalhar para o Serviço Colonial do Governo Britânico, no Oriente (Malásia), onde conheceu um “swami” (monge hindu) que o ensinou a meditar através da repetição de um mantra.
Voltando à Europa, John Main foi lecionar Direito em Dublin e depois exercer a advocacia em Londres, onde, mais tarde, aos trinta e três anos, se fez monge beneditino. Para seu dissabor, o mestre de formação recomendou-lhe que abandonasse aquele método de meditação porque não era uma “forma cristã de oração”.
Alguns anos mais tarde, trabalhando como reitor de um colégio beneditino em Washington, ele encontrou, nas “Conferências” de João Cassiano, a tradição cristã do “mantra” (repetição de uma palavra sagrada). Após essa descoberta providencial, ele voltou com novo entusiasmo ao caminho da meditação, agora fundamentada na rica tradição contemplativa cristã.
De volta a Londres, exerceu a função de Prior e Mestre de Noviços em sua abadia de Ealing. Nessa ocasião, fundou um centro de meditação cristã com o intuito de ensinar e partilhar esse antigo e sempre novo caminho de oração.
Em 1977, a pedido da Arquidiocese de Montreal, Canadá, John Main fundou o Priorado Beneditino de Montreal para ser um mosteiro contemplativo em pleno centro urbano, dedicado à prática e ao ensino da meditação. Aí, nesse mosteiro, ele passou os últimos anos de sua vida como um incansável apóstolo da meditação.
John Main faleceu em 30 de dezembro de 1982, no mesmo mosteiro fundado por ele, a partir do qual seus ensinamentos e seus ideais se espalharam pelo mundo afora.
No seu livro “A PALAVRA QUE VEM DO SILÊNCIO” (ed. Paulus), John Main expõe o seu método de meditação:
“...Vou explicar a técnica básica da meditação. Sente-se confortavelmente e relaxe. Certifique-se de que está sentado em posição erecta. Respire calma e regularmente. Feche os olhos e depois, em sua mente, comece a repetir a palavra que você escolheu como sua palavra de meditação. (...) O que é importante lembrar a respeito do seu mantra é escolhê-lo, se possível, consultando seu mestre, e depois faz-se mister conservá-lo com perseverança. Se você começar a trocar e mudar o seu mantra, estará atrasando seu progresso na meditação.”(pág. 27-29).
“Repita a palavra ou frase calmamente, serenamente, e, sobretudo, com absoluta fidelidade ao tempo pleno de sua meditação, que deve ficar entre vinte e trinta minutos.” (pág.32).
“Por meio do mantra, deixamos atrás de nós todas as imagens que passam e aprendemos a repousar na imensidão infinita do próprio Deus.” (pág. 36).
“Lembre-se de que, para meditar bem, você precisa do lugar mais sossegado que possa encontrar. (...) Para meditar, você precisa apenas repetir o seu mantra com fidelidade perseverante. (...) Em sua meditação, você não irá concentrar-se em idéias ou em imagens. Você irá concentrar-se no mantra e no silêncio a que ele o leva.”. (pág. 82-83).
4. A ESCOLA FRANCISCANA DE MEDITAÇÃO
A Escola Franciscana de Meditação (EFRAM) pratica a meditação invocando o Santíssimo Nome de Jesus no início e no final de cada dia. Os meditantes também invocam o Santo Nome durante os afazeres cotidianos com o intuito de cultivar continuamente a “lembrança de Deus” no coração.

Frei Salvio Romero (Eremita Capuchinho).

terça-feira, 8 de outubro de 2013

Reencantar a vida religiosa franciscana a exemplo de São Francisco



Existe uma palavra que está sendo resgatada hoje: reencantar! Ela nos remete à uma nova motivação. Ela quer dar mais dignidade e beleza ao nosso projeto de vida, ao nosso programa de vida, à nossa Forma de Vida.
Reencantar é despertar a riqueza que já está dentro de nós, que está dentro do patrimônio do nosso carisma.
Reencantar é cuidar, preservar, animar e nunca abafar. Nós temos uma obra-prima para ofertar: a nossa vocação! Ela é a nossa grande riqueza, nós valemos pelas escolhas que fizemos, e estas revelam a nobreza que habita em nossa vida.
Reencantar a Vida Franciscana é voltar a sonhar como Francisco. Sem sonhos não se traçam caminhos. Francisco sempre viveu de desejo e de sonho: “É isso mesmo que eu quero, é isso mesmo que procuro, é isso mesmo que desejo de todo coração!” Ai daquelas pessoas que não sonham o Novo e o Grande a ser realizado! Pessoas sem sonhos afundam-se no brejo da mediocridade.
Francisco foi um imenso sonhador por isso mesmo foi um imenso realizador. Todo grupo, toda sociedade produz utopias e cada pessoa encontra forças nas utopias. É preciso alimentar a paixão da vontade para se lançar para a vida.
Uma repórter perguntou a Dom Hélder Câmara por que, já octogenário, não perdia a força, a vibração, a joviabilidade. Ele respondeu: “Ah! Minha filha, é porque nunca deixei de sonhar o melhor para o meu povo!”
Reencantar é sempre querer o melhor. Francisco quis o melhor para a humanidade, quis o melhor para o leproso, quis o melhor para a Igreja de sua época, quis o melhor para a sua fraternidade e é exatamente por causa disso que se tornou um fenômeno humano e cristão.
Nós não somos seu contemporâneo, mas como ele está presente! Ele não é analista, nem especialista, nem comentarista de algo, nem conferencista profissional… mas simplesmente cria, reinventa e revive cada relacionamento.
Faz um encontro com o humano na sua raiz, faz um encontro com as coisas bem lá dentro de sua verdade. Francisco é mais do que um indivíduo, ele é um momento dentro de nós, ele está onde deve passar a nossa humanidade. Ele é uma verdade que a humanidade criou de melhor nestes últimos oito séculos. Ele está onde os espíritos mais sadios hoje querem estar.
É como diz o grande franciscanólogo Agostinho Gemelli: “O fascínio que exerce a figura de Francisco ultrapassa os limites de uma Ordem e da própria Igreja. É um Santo Universal, um homem que ocupa um dos patamares mais altos na passagem espiritual da humanidade. Um simples homem amado por todos. Santo com alma de Evangelho e coração de Irmão!”. Assim deve ser a proposta de nossa vida, viver a profundidade do humano e de todos os relacionamentos.
Prestar muita atenção no potencial de todas as pessoas e de todas as coisas. Assim deve ser um jeito de Vida que une, liga e religa todos os seres, esta é nossa maneira Religiosa; e porque temos Francisco como nosso Modelo vivo, podemos dizer que esta é a nossa vertente franciscana.
autor: Frei Vitório Mazzuco Filho

Frei Vitório Mazzuco Filho
Frei Vitório Mazzuco Filho

Fonte:  http://www.franciscanos.org.br